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  • Foto do escritorFernando Kimura

Criatividade e ética.

Atualizado: 29 de set. de 2021


A criatividade está associada ao nosso repertório, é evidente que quanto mais consumirmos conteúdos diferentes, e estimularmos nossa criatividade construímos novas conexões e possibilidades.


Observo que a criatividade muitas vezes está também relacionada a quanto estamos dispostos a consumir conteúdos incomuns, ou que a princípio não compreendemos.


Como um filme que começamos a assistir e leva um certo tempo para que consigamos entender o que está ocorrendo.

Assim observo a criatividade, e por isso gostaria neste post de propor a você um conteúdo incomum, e espero que este conteúdo te ajude a observar perspectivas que talvez você ainda não tivesse observado.

Nomeie o post de Criatividade e ética pois vamos neste conteúdo nos deparar com estes dois temas.

Compartilho com você aqui um artista que conhecei 33 Bienal de arte moderna em São Paulo (2018), nesta Bienal conheci obras de um artista latino chamado Aníbal López (1964 - 2014) Guatemala.


Logo que entrei no espaço onde obras de Aníbal estamos expostas, me deparei com um quadro que chamou minha atenção, denominado El préstamo (o empréstimo) em português.


O EMPRÉSTIMO - No dia 29 de setembro de 2000 realizei uma ação, a qual consistiu em assaltar uma pessoa com aparência de classe média. Foi da seguinte maneira: armado com uma pistola sai em uma rua na zona 10 (área/bairro), abordei um homem com uns 44/45 anos, cabelos castanhos e ralos, um pouco gordo, apontei a pistola em direção de sua cabeça/rosto e disse a ele: Isso não é um assalto, é um empréstimo, e vou devolver a você através de linguagem visual para seus filhos. A pessoa me entregou $874,35 (equivalente a US$ 100). Esta obra está sendo patrocinada por o homem que foi assaltado, o qual financiou: os convites, a montagem e os brindes desta amostra.

A-1 53167 - Guatemala 21/10/58 D.O


Confesso que ao entrar esta primeira impressão já me causou um impactou, obras construídas a partir de um assalto que ele considerou um empréstimo.

A partir disso comecei a observar as obras relacionadas ao assalto, eram esculturas feitas de barro.



Confira algumas imagens das esculturas:

O artista criou aqui um dilema, questionando a ética, a moral, o poder, a justiça, e para abordar este tema ele comete um crime, as obras questionam diversos temas sociais, confesso que levou um certo tempo para interpretar as cenas/situações.


Logo observei: cenas de violência, queima de arquivo, tortura, aborto ilegal, cenas conectadas a corrupção, poder das autoridades, questionamentos sociais.


Interessante não, há um áudio com o Aníbal nos explicando a obra, desde a ideia do assalto, sua concepção, você consegue escutar abaixo, logo após segue uma transcrição em português:



Transcrição do áudio:

El préstamo é sobre assaltar uma pessoa para pedir dinheiro para poder montar uma exposição, porque eu não tinha nem um tostão. E fiz isso. Foi feito um vídeo, mas o vídeo não dá para ver por que é à noite e... é complicado... bah... mas fizemos. Digo fizemos porque tive cúmplices: o cameraman, eu e a arma – que sequer era minha e nem estava carregada. E então, coloquei a arma na cabeça da pessoa, assim e disse: olha, entra no carro, agorinha me dá o que você tem. E tirou trinta pesos ou algo assim, depois tirou oitenta... foram quase cem dólares. Então eu disse: e isso é tudo que você tem? Sim, me disse. Não quero teu cartão, não quero cheques, não quero nada disso, somente isto. Deixei-o aí metido e fui embora. E depois montei a exposição, a exposição dizia... você conhece “El préstamo”, aí você passa as fotos se quiser, que é “O dia quinze do mês tal e tal realizei uma ação que consistiu em assaltar uma pessoa de tanto e tanto e tal idade, isso e aquilo”. Ainda me sinto culpado, mas precisava ser feito, porque trata da ética e da moral, porque a um artista lhe é permitido fazer tudo e ninguém nunca denunciou nada, isso que é pior! Porque teriam que ter me denunciado! Todos que conheceram foram beber seu vinhozinho. Além do mais, com isso foi pago o vinho! Não todo o vinho, parte do vinho, mas essa parte desse vinhozinho que beberam é cumplicidade. Então, todos são cúmplices e aqui ninguém está salvo. E o artista menos! Eu acredito que ofereci um sacrifício, que ainda dói porque ainda não esqueço, foi muito forte, mas um sacrifício que implica dizer que o artista não tem direito de fazer tudo, mas ninguém fez nada para dizer o contrário.


Achei bem interessante a ideia e a abordagem, na exposição estavam outras obras de Aníbal, que sempre assinava suas obras utilizando o número de seu documento A-1 53167 (tipo RG), e cidade e data da obra Guatemala 21/10/58 D.O,


Aníbal assinava suas obras com número do documento fazendo uma alusão / referência a nossa posição social perante o sistema onde somos somente um número e não pessoas.


Como percebeu Aníbal não é um artista, ou melhor um pensador óbvio ele nos coloca frente a questionamentos que muitas vezes se multiplicam como podemos ver em "El préstamo", outra obra que podemos considerar uma obra de arte efêmera de Aníbal.


Nesta outra obra do uma performance de atuação política, Aníbal foi um precursor nestes tipo de performance.


A performance denominada "Una tonelada de libros tirada sobre la Avenida de la Reforma" onde um caminhão despejou uma tonelada de livros em uma Avenida da Cidade de Guatemala.

Aníbal questiona a desigualdade social em seu país, o acesso à informação e a cultura.

Em alguns minutos a avenida foi desocupada, pouco a pouco os pedestres foram levando os livros.


Paro para observar lá no começo do post, onde comecei falando de criatividade e ética, e me pergunto e aproveito para perguntar a você que está aqui lendo a esta informação, seria possível essas construções e criações sem que Aníbal questionasse a ética?


E a criatividade quando misturada com estas questões não pode nos auxiliares a encontrar novas respostas?


Obrigado por sua leitura, deixe seu comentário.


Aproveito para te convidar a conhecer minha nova palestra.






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